sábado, 6 de setembro de 2008

2Paulo . X = 3 N

Naquela parada, eu evitava olhar para ele... era um sentimento estranho... talvez medo. Mas também sentia uma alegria imensa (será sonho?!), algo que acontecia direto nos meus sonhos, acontecer assim, e quase sem explicação...

- Pai... - chamei-o.

- Diga, filha - respondeu atento, mas calmo.

- Me explica como você desapareceu assim, como conseguiu atestado de óbito? - perguntei, e como senti que era o momento oportuno, disparei o resto das minhas dúvidas - quem mais sabe? E minha mãe? Pra quê você...

- Cala a boca! - interrompeu ele, gritando, nervoso - Não te interessa, moleca!

Tive medo, muito medo. Eu tinha esquecido desse lado bruto do meu pai. Bruto e doido: estávamos apenas eu e ele no ponto de ônibus. Se eu falasse mais alguma coisa, das três uma: ele me batia (ou me matava), se fazia de vítima pedindo socorro ou simplesmente iria embora pra dessa vez nunca mais voltar. Fiquei calada, maquinando isso na hora...

Ele olhava pra mim, com uma cara de arrependido. Aquela hora também me lembrei dos ataques de arrependimento que ele tinha, só faltava alí ele me comprar algo, pra se desculpar, como sempre fazia quando eu era criança.

Vinha nosso ônibus. Subimos. Eu passei pela catraca e ele ficou na frente, sentadinho... idoso... 77 anos!

Até que foi um alívio eu ter ficado longe dele nesse percurso. Até encontrei Thomas, meu novo amigo francês e todo enrolado. Bem preferível falar um francês tosco que ouvir os gritos de meu pai... Ah, eu tinha esquecido como eu me irritava fácil com ele...

Menos de dez minutos depois, já estávamos descendo... O velho, já irritado, queria logo água. Chegou perto do vendedor e pediu duas garrafas. Me assustei e com certeza o vendedor ficou muito assustado quando meu pai tirou da carteira um bolo de notas de cem, tirou uma e pagou.

- Meu senhor, tenho troco não - desculpou-se o rapaz.

- Sem problemas, meu jovem, fique com o troco - disse meu pai, com um sorriso no rosto, enquanto o vendedor estupefato mal conseguia se mexer com a nota nas mãos.

Finalmente, o Teatrão! Olhei no relógio: duas e quinze. Cuspi um palavrão qualquer. Peguei o velho pelo pulso e segui rápido para dentro. Na recepção, outro Paulo lá estava. O Michelotto.

E Paulo e Paulo se entreolharam. Olharam se até muito. Muito demais para meu gosto. Desgosto

Um comentário:

polly disse...

E depois o que acontece?